ENTREVISTA COM JAY JAY FRENCH (TWISTED SISTER)
A vida é feita de oportunidades. Em 2009, peguei meu parco dinheirinho de estagiário de assessoria de imprensa e comprei o ingresso para o primeiro show do Twisted Sister no Brasil. Na época, a banda — Dee Snider (vocais), Jay Jay French (guitarra), Eddie Ojeda (guitarra), Mark “The Animal” Mendoza (baixo) e o saudoso AJ Pero (bateria) — estava retomando as atividades para comemorar os 25 anos do clássico “Stay Hungry” (1984). Como bom SMF que sou, cantei até perder a voz e lavei a alma com o suor de quase duas horas pulando num Via Funchal praticamente lotado. Passados mais de dez anos, quem diria que eu, jornalista com diploma, estaria entrevistando ninguém menos que Jay Jay — membro fundador e o homem por trás dos negócios do grupo. Nosso primeiro contato foi pelo Instagram, em novembro do ano passado, quando ele aceitou ser entrevistado por mim para o Metal Na Lata. Seu único pedido foi: “não mais que dez perguntas”. Eu não respeitei isso e, felizmente, nem ele. Confira abaixo o resultado!
Por Marcelo Vieira
Fotos: Divulgação
Metal Na Lata: A última apresentação ao vivo do Twisted Sister foi no Northside Rock Park Meeting Fest em 2016. Desde então, você está curtindo uma vida longe da estrada, mas não uma vida longe do trabalho. O que você tem feito desde então?
Jay Jay French: Sou palestrante motivacional e tenho um livro que será lançado no início do ano que vem no qual falo sobre a criação e o gerenciamento do Twisted Sister, além de dar conselhos a qualquer pessoa sobre como lidar com sucesso e fracasso. Também escrevo para várias publicações, como a revista de negócios Inc., a revista de música Goldmine — na qual tenho uma coluna sobre os Beatles — e a áudio revista Copper.
Metal Na Lata: Por 55 milhões de streams de “Baby I Love Your Way”, Peter Frampton recebeu 1,7 mil dólares e, para meio bilhão de streams de “Livin’ on a Prayer”, o pagamento de Desmond Child foi de 6 mil dólares. É muito pouco dinheiro, se pararmos para pensar. Como a maioria do catálogo do Twisted Sister encontra-se disponível em plataformas de streaming como o Spotify, você tem alguma esperança de que esses valores subam lentamente ou é apenas uma questão de “jogar o jogo de acordo com as regras”?
Jay Jay French: O streaming é a maneira mais recente de divulgar a música e é melhor que as pessoas paguem pouco por isso do que não paguem nada. O lado bom é que essas plataformas tornam a nossa música acessível a milhões de novos fãs que não seriam capazes de obtê-la de outra forma. O lado ruim é que, de fato, os valores precisam melhorar! No entanto, estamos ganhando mais dinheiro com royalties do que nunca.
Metal Na Lata: As músicas mais tocadas do Twisted Sister no Spotify são “We’re Not Gonna Take It” (144 milhões de streams) e “I Wanna Rock” (77 milhões). Elas são, provavelmente, as músicas-assinatura da banda. Na sua opinião, vocês possuem músicas que representem melhor o que é o Twisted Sister do que elas?
Jay Jay French: “We’re Not Gonna Take It” e “I Wanna Rock” são hinos internacionais porque falam universalmente, apesar de ambas as mensagens serem muito diferentes. “I Wanna Rock” é pura e simplesmente uma música de festa. Já “We’re Not Gonna Take It” é uma afirmação que se tornou a música de protesto número um do mundo. Ela dá voz a centenas de milhões de pessoas que se sentem desprovidas de direitos ou insatisfeitas com determinados aspectos de suas situações individuais. Somadas às letras incríveis de Dee, ambas as músicas são incríveis e inesquecíveis. Mesmo os jovens que nunca ouviram falar do Twisted Sister conhecem a música em todo o mundo! Nós não poderíamos estar mais orgulhosos disso!
Metal Na Lata: Você gostou da versão que Dee Snider fez de “We’re Not Gonna Take It”, lançada em 2017?
Jay Jay French: Acho que Dee lançou essa versão para angariar fundos para alguma instituição de caridade. É uma versão muito poderosa.
Metal Na Lata: E o que você acha do material solo lançado por Eddie Ojeda?
Jay Jay French: Ouvi várias faixas do álbum solo de Eddie. Eu apoio os projetos solo de cada integrante do Twisted Sister. Eddie e eu estamos juntos há mais de 50 anos!
Metal Na Lata: Ninguém pode negar que Gene Simmons é a cara do KISS. Mas Paul Stanley é, em essência, aquele que mantém as coisas em movimento. Para mim, é quase como o que acontece no Twisted Sister, com Dee Snider sendo o rosto, mas você fornecendo o batimento cardíaco da banda. Estou certo? Como as coisas funcionam nos bastidores e nos negócios quando se trata do Twisted Sister?
Jay Jay French: Antes de qualquer coisa, deixemos claro que Dee escreveu músicas incríveis, além de ser um dos maiores vocalistas da história do rock! Mark, Eddie e AJ são alguns dos maiores músicos do mundo. Sem os seus talentos, eu não poderia fazer o que faço. Nos 47 anos de existência da banda, eu administrei seus negócios por cerca de 40 deles. O negócio da música é um mar revolto e, ao longo dos anos, através de muita experiência, aprendi a navegar por ele. Também gerenciei muitos outros artistas — metal, hip hop, jazz, cantores/compositores, músicos de blues e artistas pop femininos. Cada um deles me fez um profissional melhor. Eu venho do ponto de vista do artista e zelo pelos interesses da banda assim como zelo pelos meus interesses. Se eu consigo fazer grandes negócios, quem sai ganhando é a banda! Tenho orgulho de trazer para a banda tudo o que aprendi.
Metal Na Lata: Como você sintetizaria em uma palavra (ou pequena frase) cada um dos sete álbuns de estúdio do Twisted Sister?
Jay Jay French: “Under the Blade”: ‘Finalmente!’; “You Can’t Stop Rock ‘N’ Roll”: Divertido; “Stay Hungry”: Inovador; “Come Out and Play”: Uma sequência excelente, porém, decepcionante; “Love is for Suckers”: A despedida; “Still Hungry”: Uma versão que finalmente podíamos ouvir porque parecia nossa, por ser mais pesada; “A Twisted Christmas”: A volta e a gravação mais divertida que já tivemos.
Metal Na Lata: Como há muitos aniversários chegando — 40 anos de “Under the Blade” e 35 anos de “Come Out and Play”, por exemplo —, e você é o homem por trás dos relançamentos da banda, o que os fãs podem esperar em termos de produtos num futuro próximo?
Jay Jay French: Esses relançamentos são um desafio maior do que parece, pois envolvem fazer com que a gravadora compartilhe da minha visão de produto, e existem muitas variáveis. Nosso selo, Rhino, acabou de aprovar o lançamento de uma versão Mobile Fidelty de “Stay Hungry”. Será a primeira vez que teremos nossa música lançada em vinil de alta-resolução! Existem vários outros produtos em consideração, mas os anúncios serão feitos quando eles estiverem prontos. Esperamos lançar muitos vídeos de shows da turnê final de 2016 que estão, atualmente, engavetados. Sugiro que os fãs acompanhem o canal oficial do Twisted Sister no YouTube e nossas redes sociais — Facebook e Instagram — para receberem as atualizações.
Metal Na Lata: E quanto a gravar novas músicas e tocar ao vivo? Por melhor que tenha sido o trabalho de Mike Portnoy no DVD “Metal Meltdown” (2016), os fãs devem perder a esperança de ver o Twisted Sister em turnê ou entrando em estúdio para mais um álbum?
Jay Jay French: Em 1988 eu disse que nunca mais faríamos shows. Bem… Nós fizemos e também gravamos muito material, como a regravação de “Stay Hungry” [“Still Hungry”], com todas as faixas bônus, em 2004, e, em seguida, o álbum de Natal, em 2006. Dito isto, não há planos de nos apresentarmos ao vivo ou gravarmos qualquer música no momento. E não há palavras para agradecer a Mike Portnoy por ter feito tudo certo substituindo AJ. Mike é talvez o melhor baterista de rock da atualidade e, se um dia tocarmos novamente, entraremos em contato com ele primeiro.
Metal Na Lata: Poucas pessoas sabem, mas você possui uma enorme coleção de guitarras modelo Les Paul da Gibson — especialmente as com acabamento goldtop. Como também sou guitarrista, e muitos leitores do Metal Na Lata também são, eu gostaria que você falasse sobre a sua coleção. Quantos instrumentos você tem, quais são os mais raros e incomuns e quais estão entre os seus favoritos e por quê?
Jay Jay French: Já possuí centenas de guitarras e atualmente tenho cerca de sessenta. Eu tinha uma enorme coleção de guitarras vintage. Vendi muitas delas nos últimos anos. Minha peça favorita é uma Gibson Les Paul Jr. de 1954, que custou 99 dólares naquele ano. Não é de longe a mais valiosa, pois tenho muitas goldtops e guitarras de outras marcas e modelos que valem milhares de dólares. Mas, para mim, essa é a melhor.
Metal Na Lata: Eu gostaria de encerrar essa entrevista com uma última pergunta sobre legado. De quais realizações da sua vida — com relação à música ou não — você mais se orgulha? Alguma que realmente faz você acreditar que valeu a pena o trabalho duro ou a espera. Existe um momento específico em sua vida que, se você pudesse, gostaria de reviver para sempre?
Jay Jay French: Falo muito sobre isso nas minhas palestras motivacionais. Costumo brincar que entre todas as realizações, os milhares de shows ao vivo, os milhões de discos vendidos e o fato de que a nossa música é mais licenciada — ou seja, a que mais aparece em filmes, programas de TV e comerciais — do que a de qualquer outra banda de heavy metal da história, o que mais me orgulha é que, em 1988, nós entramos na lista das dez mulheres mais mal vestidas do mundo do [crítico de moda] Mr. Blackwell! Embora isso seja verdade, sou apenas eu sendo engraçado. A resposta real é que tenho orgulho de ainda sermos relevantes 47 anos após a criação da banda. Tenho orgulho de Dee, Mark, Eddie e eu termos estado no inferno e continuado amigos.
Metal Na Lata: Obrigado por aceitar a minha solicitação de entrevista, Jay Jay. Espero que você tenha gostado desse bate-papo tanto quanto eu. Que tal terminarmos com uma mensagem sua para os seus fãs no Brasil e para os leitores do Metal Na Lata?
Jay Jay French: Chegamos tarde à América do Sul. Todas as bandas precisam tocar na América do Sul para conhecer a paixão que os fãs têm. É quase surreal! O primeiro país sul-americano em que tocamos quando voltamos foi o Brasil. Tocamos em São Paulo, em 2009. O promoter, Paulo Baron, nos disse que os fãs enlouqueceriam. Meu Deus do céu! Isso foi um eufemismo! Foi muito emocionante para nós, pois os fãs eram impressionantes. Toda vez que falo com artistas de qualquer estilo musical e a conversa chega aos melhores públicos do mundo, sempre respondem Brasil, Argentina e México. Isso diz mais sobre vocês do que qualquer coisa que eu possa dizer. Eu acho que existe uma vibe cultural e quase “religiosa” em nossos fãs sul-americanos. É claro que isso inclui também o Chile e a Bolívia, onde também tocamos, e eu entendo que a mesma paixão também seria encontrada em todos os outros países em que nunca havíamos tocado. Eu não quero parecer forçado falando sobre isso — temos ótimos fãs em todo o mundo —, mas a interação e a eletricidade humana quando se trata de tocar na América do Sul em geral, e nossa experiência particular em São Paulo e Curitiba, permanecerão no fundo do meu coração até eu dar meu último suspiro! Essa é uma das razões pelas quais eu não preciso mais fazer shows. Vimos e experimentamos a beleza desse amor pela banda e isso continua sendo o ponto mais alto em nossa história!
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