Lucifer – Fabrique Club, São Paulo/SP (06/10/2024)
Produção: Xaninho Discos e Caveira Velha Produções
Texto e fotos por: Matheus “Mu” Silva
Quase dois anos após sua bem sucedida estreia no Brasil, o Lucifer retornou ao Brasil com três datas, sendo o show de hoje ocorrido em São Paulo/SP, ontem (05) no Rio de Janeiro, e terça (08) será em Belo Horizonte. Com sua “Satanic Panic Tour”, a banda veio divulgar o último disco “Lucifer V” (2024), e o show ocorreu no Fabrique, assim como em sua primeira passagem. Com produção da Xaninho Discos em parceria com a Caveira Velha Produções, ainda incluíram mais cinco nomes emergentes do cenário underground, mantendo a filosofia deles de democratizar o espaço dado em eventos com bandas internacionais.
Formada em 2014 na Alemanha e posteriormente fixada na Suécia, a banda está fazendo 10 anos de sua formação, mas vem fazendo um barulho enorme na comunidade metal. Com seu som flertando com Stoner e aquele Heavy Rock setentista, eles chegaram ao seu quinto trabalho de estúdio, no topo de seu jogo. Liderada pelo casal formado pela talentosa vocalista Johanna Sadonis, e pelo baterista Nicke Andersson (que, além de ter tocado no Hellacopters, ainda gravou o seminal disco de Death Metal “Left Hand Path”, do Entombed), eles conquistaram o público fazendo um som bem acessível, com aquele peso que as bandas antigas carregavam, mas com muita identidade. As comparações com o Coven são um tanto inevitáveis, muito por conta do visual da vocalista e do som procurar resgatar a alma daquele período, mas isso passa longe de ser algo que faça a banda soar ou parecer uma imitação barata, muito pelo contrário, é até saudável essa comparação, pois o Coven foi percursor de muita coisa, seja pelo som pesado, ou pelos temas líricos voltados para o ocultismo, lá no longínquo ano de 1968, antes mesmo do Black Sabbath furar a bolha. Mesmo assim, o Lucifer conseguiu manter uma consistência admirável, lançando cinco discos bem distintos, sem ficar maçante ou soarem parecidos entre si, e isso justifica a atenção que vem recebendo ao longo dos anos, de forma merecida.

Com a casa abrindo às 15hs, a primeira banda do dia, Night Prowler, de Osasco/SP subiu o palco às 15:30, despejando seu Heavy Metal tradicional no público. Banda relativamente jovem, de 2017, eles seguem divulgando seu único álbum de estúdio, o ótimo “No Escape…” (2018), além de alguns Singles lançados nos últimos anos. Músicas como a faixa título de seu debut e “Make it Real” foram bem recebidas pelo público, que estava adentrando devagar na casa. Fizeram um set de meia hora, aproveitando cada minuto disponível, mesmo com o som levemente abafado, entregaram um bom show.

Às 16:25, entrou em cena o Weedevil, banda que faz um Stoner/Doom chapado com vocal feminino. Formada em 2019 na cidade de São Paulo/SP, eles tem se tornado cada vez mais frequentes nos eventos mais underground, hoje tendo a oportunidade de fazer um show em uma casa maior, e fizeram valer isso, entregando uma apresentação boa, mas que infelizmente foi prejudicada pelo som, onde tiveram dificuldades com os retornos, e uma das guitarras estava inaudível a maior parte do set. Era um pouco visível a apreensão deles, talvez pela preocupação em ter sua apresentação comprometida. Mesmo com os problemas técnicos, não se deixaram abater, e durante a meia hora de palco que tiveram, mandaram ver em sons do seu novo material “Profane Smoke Ritual” (2024), com músicas interessantes como “Chronic Abyss of Bane”, “Necrotic Elegy”, e a faixa título. Vale a pena ir atrás do som deles, pois esse último full lenght que lançaram recentemente, é certamente um dos melhores discos do ano.

Na sequência, iniciando sua apresentação às 17:10, foi a vez do Tantum, banda de Hard/Heavy também com vocal feminino, de Belo Horizonte/MG. Aliás as mulheres vocalistas se fizeram maioria, sendo quatro das seis vozes do evento, o que foi bem bacana, pois todas tinham estilos bem distintos. E “distinto” foi a palavra de lei durante o show da Tantum. Com todos vestidos de forma bem exótica, fizeram o show mais diferenciado da noite, pois além da música, eles entregam uma performance visual bem peculiar. A vocalista Chervona é imparável: dançou, cantou, tocou flauta, teclado… Além da questão teatral permeando as músicas, como em determinado momento tocaram encapuzados e com a vocalista imitando a figura vendada de justiça, e durante a música “Rojo”, que ela estava vestida como se fosse de noiva, e com um cálice de sangue. Ainda tocaram uma música nova, “On The Road”, em que Chervona ensinou os presentes a cantarem o refrão, e corresponderam durante a música. Com quase 40 minutos de set, são uma banda bem original, e a questão da presença de palco de todos é um ponto bem positivo, nunca tinha visto isso de uma banda nacional, essa preocupação em agregar tantos elementos durante as músicas, o que torna a Tantum uma banda a ser acompanhada.

A próxima banda foi o Pesta, de Belo Horizonte/MG, começando seu show às 18:20. Aqui o som já estava bem melhor, o que colaborou pra que a apresentação deles tivesse mais impacto. Praticando um Stoner Metal pesadíssimo na linha do Pentagram e Cathedral, a banda simplesmente detonou. Com a casa já bem mais cheia, fizeram um set ótimo, com músicas como “Anthropophagic”, “Witches Sabbath” e “Moloch’ Children”, todas do disco “Faith Bathed in Blood” (2019), além de “Words of a Madman” e “Black Death”, do “Bring Out The Dead” (2015) . Sem muito espaço para falar, tendo o vocalista agradecendo o público algumas vezes e só, focaram em extrair tudo o que pudessem durante seus 40 minutos de set, com um som carregado, sujo, bem característico do estilo, pra acompanhar batendo cabeça em cada marcação.

A última atração nacional do dia, Space Grease, subiu ao palco às 19:20. Com seu som meio Stoner Rock/Heavy Rock, também se usaram de elementos interessantes pra agregar na música, com a vocalista o tempo todo com chocalhos nas mãos, e até um integrante tocando conga e algumas doses de hardcore e psicodelia no som. A vocalista Ju Ramirez tem uma voz bem agradável, cantando de forma limpa por todo o tempo, em boa sintonia com o tom da musicalidade da banda. Tocaram músicas de seu EP “Can’t Hide (2023), tendo músicas como “Burning Inside My Chest”, a faixa título, “Breakdown”, o single “Separation Time”, além de um bloco dedicado a músicas que farão parte de seu vindouro debut, como “Empty Man”, “Lose Control”, e “Cheap Drugs”. O show deles foi possível graças ao novo baterista, que entrou pra banda pouco antes do show, mas ajudou eles a entregarem uma apresentação digna.
Finalmente, às 20:30, o Lucifer, a atração principal da noite, iniciou seu ato. Iniciando com “Crucifix (I Burn for You)”, do “Lucifer IV” (2021), a banda começou explosiva, com vários presentes cantando junto. Voltando um pouco mais no tempo, emendaram duas do “Lucifer III” (2020), com “Ghosts” e “Midnight Phantom”, até tocarem uma de suas músicas mais conhecidas, “Dreamer”, do “Lucifer II” (2018), e com Johanna vendo que tinha o público já ganho, apontava o microfone pro público cantar o refrão, cobrindo até a voz dela, de tão empolgada que a galera estava. Para apresentar o disco novo, “Lucifer V” (2024) tocaram “A Coffin Has No Silver Lining”, outra faixa bem cantada por todos. É notável o impacto musical que o Lucifer teve, pois pra uma banda com cinco discos em dez anos, seu público foi realmente cativado, a maioria do público sabia cantar todas as músicas, principalmente do disco novo, que saiu no começo do ano, mas mesmo assim, aproveitaram bem o momento. Mais uma do “IV”, “Wild Hearses”, essa com uma veia tão Black Sabbath, tem um início parecido com “N.I.B.” e ainda tem Johanna mandando um “Alright Now” no meio da música, uma clara referência a Ozzy e seus asseclas.


Aí veio uma sequência do último disco, com “Fallen Angel”, que literalmente tirou todo mundo do chão, com a galera pulando e se divertindo, seguida por “At The Mortuary”, com Johanna dizendo que a música falava sobre um “amante cadavérico”, com ela acenando e apontando pra quem tinha o celular mirando nela, quem conseguiu filmar o momento vai guardar uma boa lembrança e, sem cerimônias, mandaram também “The Dead Don’t Speak”. Na verdade, o show em si contou com poucas interações com o público, foi música atrás de música, praticamente sem tempo pra respirar, o que deu até uma impressão que estavam com pressa, mas a presença de palco tanto da carismática vocalista fazendo caras e bocas, como da banda totalmente entrosada, diminuiu um pouco essa sensação. Logo veio a balada soturna “Slow Dance in a Crypt”, e terminando a primeira parte do set, tocaram “Bring Me His Head”, do “IV”, com Nicke chamando ela na bateria, essa evidentemente bem conhecida do público, que cantou e dançou durante toda a sua execução. Teve até uma brincadeira entre a vocalista e um dos guitarristas, ameaçando o decapitar se não ficasse em seu devido lugar no palco, mostrando como também estavam se divertindo no palco durante toda a apresentação.


Para o bis, a banda retornou tocando um trecho instrumental de uma música do Beatles, “I Want You (She’s so Heavy)”, seguida pela divertidíssima “Maculate Heart”, do “V”. E finalizando a noite, uma dobradinha do “II”, com “California Son” e “Reaper On Your Heels”, terminando assim seu set, que mesmo com a curta duração, cerca de uma hora e dez minutos, entregaram tudo o que o seu público queria ver.
Com um estilo que cresce cada vez mais no Brasil, o Stoner tem apresentado cada vez mais bandas em nosso cenário, e hoje alguns desses nomes ajudaram a cimentar que aquela música pesada criada nos anos 70, e tem muito espaço aqui. Isso tudo foi coroado com um dos maiores representantes do estilo na atualidade, com um show que só quem estava lá, vai entender o que foi. O Lucifer finalizou de forma perfeita, uma noite dedicada a música pesada, e mais uma vez mostrando o poder das vozes femininas da nova geração. Todas as bandas, sem exceção, tem menos de dez anos de existência, o que torna ainda mais marcante, saber que todo mundo tá correndo firme e forte atrás do seu espaço, com músicas originais, e sendo bem recebidas pelo público como um todo. Uma via de mão dupla, onde todos saíram ganhando.
