Deep Purple – Espaço Unimed, São Paulo/SP (13/09/2024)
Produção: Mercury Concerts
Assessoria: Catto Comunicação
Texto por Ivan Luiz de Oliveira
Fotos gentilmente cedidas por Leandro Almeida (Rock Brigade)
O que é ser velho? A pergunta, que pode não ser politicamente correta nos dias de hoje, foi feita intencionalmente, pois ser “velho” é um estado de espírito. Você pode ser idoso e não ser velho, assim como o contrário também é válido.
Mas, respondendo sob a ótica deste redator, ser velho é se entregar, acreditar que a hora do merecido descanso está próxima e que nada mais pode ser oferecido ao mundo, ou a si mesmo. É reclamar de tudo, não ver beleza em nada, parar de produzir, acomodar-se no que fez no passado e sentar-se à espera do “fim” que julga estar próximo.
Pois bem, com certeza os senhores do Deep Purple estão longe de serem velhos, caros leitores. É claro que há sinais físicos da idade. Afinal, Ian Gillan está com 79 anos, Roger Glover com 78, e Ian Paice e Don Airey com 76 (falaremos sobre o “novato” Simon McBride mais adiante). As rugas estão ali, mas o entusiasmo, a paixão e a vontade continuam intactos. E, sem dúvida, para uma banda com mais de 55 anos de estrada, eles estão muito acima da média.
Vamos ao show. Cheguei por volta das 20h ao Espaço Unimed, sem dúvida uma das melhores opções para shows de médio porte na capital paulista. O entorno tinha um bom movimento, mas não estava lotado como em outros eventos. Dentro da casa, por volta das 20h30, minha impressão era de que o show seria um fracasso, pois o local estava muito vazio. Naquele momento, o público era majoritariamente composto por senhores e senhoras acima dos 50 anos. Porém, aos poucos, a casa foi enchendo e, sem dúvida, teve uma ótima presença de público, com até alguns jovens, possivelmente assistindo ao Purple pela primeira vez.
E o que vimos foi uma verdadeira celebração do rock, mostrando que a banda ainda entrega performances de altíssimo nível. O setlist foi uma mistura equilibrada entre clássicos e novas canções do recente álbum “=1”, lançado em 2024. Voltando ao parágrafo inicial, os britânicos continuam produtivos, lançando álbuns regularmente, e seu mais recente registro (confira a resenha do Metal Na Lata aqui) trouxe quatro músicas ao show, demonstrando que não se prendem apenas ao passado — o que valorizo imensamente.
O show começou com a icônica “Highway Star”, aquecendo o público desde o início. A escolha por abrir com essa faixa foi certeira, pois além de ser um dos maiores clássicos da banda, tem uma energia única. Claro, venho falando dos aspectos positivos, mas, caro leitor, caso não tenha ido ao show e tenha a oportunidade futura de assistir, não espere os agudos alucinantes do senhor quase octogenário Ian Gillan. Dono de uma das mais poderosas vozes do rock nos anos 70, ele continua sendo um ótimo cantor, mas tem adaptado muitas das músicas à sua atual condição. As pausas entre as canções, ou os solos instrumentais, são providenciais para ajudá-lo a recuperar o fôlego. Vale lembrar que Gillan sofreu um pequeno AVC há alguns anos, e suas mãos ligeiramente trêmulas ao longo da apresentação são mais um sinal de sua enorme força de vontade em continuar entregando arte ao público.
A banda resgatou dois clássicos do álbum In Rock: a excelente “Hard Lovin’ Man” e, com o perdão do trocadilho, a incendiária “Into the Fire”, em que Gillan mostrou uma de suas melhores performances da noite.
Como prometido, vamos falar um pouco do mais jovem integrante da banda. Como muitos já sabem, Steve Morse se afastou há alguns anos para cuidar de sua esposa, que enfrentava o câncer. Em entrevistas recentes, os membros da banda revelaram que Morse gostaria que o grupo se aposentasse, mas isso não fazia parte dos planos dos demais. Como resultado, ele foi desligado. Para seu lugar, entrou o “jovem” (com 45 anos, podemos usar esse termo) norte-irlandês Simon McBride. Sua entrada trouxe um “refresh” à banda, injetando ânimo nas apresentações. Seus solos são poderosos, porém carregam sua própria marca — mais rock ‘n’ roll do que o estilo clássico de Morse. Sem dúvida, sua presença tem contribuído muito para o quinteto, e seu solo foi bem interessante, sem cair no exagero de notas rápidas e repetitivas.
Na sequência, “Uncommon Man”, do álbum Now What?!, foi tocada em clara homenagem a Jon Lord, saudoso tecladista da banda por 40 anos. A música também serviu para demonstrar a maestria instrumental de todos os membros. Isso é algo que merece ser destacado: a banda está soando muito bem, e custa acreditar que Ian Paice está se aproximando dos 80 anos. Claro, sua aparência entrega a idade, mas seu ritmo de bateria — suíço, porém com o swing típico dos músicos dos anos 70 — é encantador.
O set seguiu com duas homenagens à preguiça: a recente “Lazy Sod”, um solo de teclado para recuperar o fôlego, e a clássica “Lazy”, do monumental álbum Machine Head.
Para mim, um dos momentos mais emocionantes do show foi a balada “When A Blind Man Cries”, em que Ian Gillan entregou sua melhor performance da noite, carregando a canção com emoção genuína. Seu discurso sobre as pessoas que passam por dificuldades ao redor do mundo trouxe ainda mais profundidade ao momento, arrepiando todos os presentes.
Outro destaque foi “Anya”, que agradou muito ao público, especialmente os fãs de longa data.
Além dos hits, o público foi presenteado com faixas do novo álbum, como “Portable Door” e “Bleeding Obvious”, que mostram, mais uma vez, que o Deep Purple continua criando. Essas novas faixas, ao lado de grandes clássicos, foram um belo exemplo da capacidade da banda de equilibrar o passado e o presente.
O segundo solo de Don Airey foi ainda mais solto, com o tecladista encantando o público ao incluir trechos de “Aquarela do Brasil” e do Hino Nacional Brasileiro. Embora as novas canções tenham sido bem recebidas, foi durante clássicos como “Space Truckin'” que Ian Paice, o único membro original restante, mostrou que ainda tem energia de sobra. O público veio abaixo com “Smoke on the Water”, cantando em uníssono um dos riffs mais famosos da história do rock.
O show foi finalizado com “Hush”, seguida por “Black Night” no bis. Esses clássicos encerraram a noite em grande estilo, consolidando mais uma vez o Deep Purple como uma das bandas mais importantes do rock. O público paulistano saiu com a sensação de ter assistido a uma verdadeira aula de Rock N’ Roll.
Respondendo à pergunta inicial: com toda a certeza, ser velho não é ser um músico do Deep Purple. Esses senhores mostraram que, mesmo com mais de 50 anos de estrada, ainda são uma força imponente no palco, entregando energia e paixão a cada acorde. O show no Espaço Unimed foi um lembrete do porquê eles ainda são reverenciados mundialmente.
Setlist:
Highway Star
A Bit on the Side
Hard Lovin’ Man
Into the Fire
Guitar Solo
Uncommon Man
Lazy Sod
Keyboard Solo
Lazy
When a Blind Man Cries
Portable Door
Anya
Keyboard Solo
Bleeding Obvious
Space Truckin’
Smoke on the Water
Green Onions (Booker T. & the MG’s cover)
Hush (Joe South cover)
Black Night









