Kanonenfieber – “Die Urkatastrophe” (2024)
Century Media
#BlackenedDeathMetal
Para fãs de: 1914, Minenwerfer, Marduk
Texto por Matheus “Mu” Silva
Nota: 9,0
Após três anos do lançamento de seu disco de estreia, “Menschenmühle” (2021), a banda de Blackened Death Metal Kanonenfieber chega com seu aguardado segundo álbum, “Die Urkatastrophe” (2024), lançado pela Century Media.
Um dos nomes que mais tem chamado atenção no cenário europeu, o Kanonenfieber, banda relativamente nova, formada em 2020, apresenta um som bem trabalhado, com temas líricos baseados na Primeira Guerra Mundial. Um fato interessante é que as músicas retratam eventos históricos reais, inspirados por um antigo diário do avô do vocalista, que lutou nesse conflito, o que torna o conteúdo da banda ainda mais interessante. Na verdade, o projeto é uma one-man band, liderado por Noise, que também tem outro projeto solo, Leiþa. No entanto, ele se apresenta regularmente ao vivo com a banda, recrutando membros para isso. Um dos fatores que mais chama a atenção é a forma como a banda se apresenta: usando máscaras pretas e uniformes militares do período da Primeira Guerra Mundial, o que agrega ainda mais sentido à sua música, cantada em alemão. Aliás, essa escolha de temas militares históricos os distingue de muitas outras bandas do gênero, que normalmente abordam temas nórdicos ou anti-religiosos, ajudando o Kanonenfieber a alcançar um público maior.
Após a curta introdução, “Grossmachtfantasie”, o álbum abre com “Menschenmühle”, de forma extremamente pesada. Mesmo com um breve trecho no qual Noise exalta algumas palavras, o andamento geral da faixa é brutal, cheio de dobras vocais. Em alusão à capa do disco, o título da música significa algo como “máquina de moer gente”, uma metáfora de como a Alemanha enviava pessoas à guerra apenas para serem consumidas, destruídas e levadas à morte em nome do “amor à pátria”. A música é tão brutal quanto seu título sugere. “Strumtrupp” mantém a pegada, sendo um pouco mais acessível, com cadências perfeitas para headbanging, incluindo uma passagem mais lenta com um discurso que reforça a ideia de estarem em um campo de batalha. Vale destacar a qualidade da gravação, onde todos os instrumentos são perfeitamente audíveis, assim como os vocais.
“Der Maulwurf” começa com um som que remete à banda cavando um túnel em uma mina de carvão e se desenrola em uma bela canção, com um ritmo mais lento e repleto de melodias, quase como se fosse um relato. A voz de Noise exala raiva e agonia, e a música ganhou um videoclipe, o que agrega ainda mais contexto. “Der Maulwurf” significa “A Toupeira”, e a letra fala sobre os mineiros que, durante a Primeira Guerra Mundial, eram tratados como toupeiras em condições insalubres, o que é retratado no vídeo, reforçando a sensação opressiva da música. O refrão (“cavar / e continuar cavando / com minha pá / a toupeira não vê luz”) é cantado em coro, transmitindo uma sensação de foco e ao mesmo tempo, desesperança. Assistir ao clipe com o contexto em mente amplifica a experiência da música.
A faixa seguinte, “Lviv zu Lemberg”, apresenta um trabalho de bateria impecável, aliando peso a passagens bem construídas e culminando em um belíssimo solo. A sensação de estar em um campo de guerra persiste, mantendo a ideia de um conflito militar durante a audição.
“Waffenbrüder” também ganhou um videoclipe, e assim como “Der Maulwurf”, isso contribui para o contexto da faixa. Na verdade, o álbum todo merecia videoclipes para todas as canções, pois o conteúdo lírico, baseado em fatos históricos, é extremamente rico. A música soa como uma continuação natural da anterior, com riffs precisos, pedal duplo intenso, e aquele som perfeito para headbanging, além de momentos que evocam uma experiência ao vivo. “Gott mit der Kavallerie” se aproxima mais do Death Metal, com pegadas groovadas. É uma das melhores faixas do álbum até o momento, com riffs simples, mas cheios de energia, remetendo ao estilo de bandas mais modernas de Death Metal Melódico, e que aqui funcionou perfeitamente. “Panzerhenker” também se destaca, cheia de groove e alternando momentos extremamente pesados com passagens mais coesas.
“Ritter der Lüfte” é uma boa canção, mas soa muito similar ao que já foi apresentado em outras faixas. O álbum é bastante consistente, talvez até demais, tornando alguns trechos previsíveis durante a audição. Tudo é muito bem executado, claro, mas essa música, em particular, não é tão memorável. Após mais um discurso em “Verdun”, a faixa “Ausblutungsschlacht” traz um andamento sombrio que explode em intensidade durante sua execução. A letra fala sobre a Batalha de Verdun, a mais longa da Primeira Guerra Mundial, em um embate entre alemães e franceses. O álbum encerra com “Als die Waffen kamen”, uma bela faixa acústica, a mais curta do disco (excluindo as introduções), algo que tem se tornado recorrente em álbuns de Black Metal, funcionando como um último suspiro antes do fim daquele tormento.
Mesmo estando apenas em seu segundo álbum, o Kanonenfieber faz jus à atenção que vem recebendo. “Die Urkatastrophe” é um ótimo disco, embora tenha alguns momentos previsíveis. O projeto possui identidade própria. As músicas são muito boas por si só, mas vale a pena conferir as traduções das letras para uma imersão ainda maior na experiência, pois a música e o contexto lírico estão intrinsecamente ligados, e isso enriquece ainda mais a proposta que Noise deseja entregar.